domingo, 14 de dezembro de 2014

Dilma costura acordo com PMDB para agradar Renan e Temer

12/12/2014 14:20
Por Redação - de Brasília

Ao lado de Pezão e do ministro Celso Amorim: conversa sobre o novo ministério
Ao lado de Pezão e do ministro Celso Amorim: conversa sobre 
o novo ministério

A costura política do governo da presidenta Dilma Rousseff para o segundo mandato, que começa em 1º de Janeiro do ano que vem, está prestes a concluir que o presidente do Congresso, Renan Calheiros (PMDB-AL), na companhia do vice-presidente Michel Temer, presidente nacional do PMDB, formam o centro de poder que o Planalto precisa para conter o avanço da ultradireita liderada, hoje no Senado, por Aécio Neves (PSDB-MG) e, na Câmara, por Eduardo Cunha (PMDB-RJ) e Jair Bolsonaro (PP-RJ). As reações adversas à aliança, cada vez mais reforçada, no entanto, traduzem-se no enterro da Lei de Meios e numa reforma política esvaziada, dois temas caros às ruas, durantes as manifestações de Junho do ano passado.
Calheiros tem demonstrado que está ao lado do governo. Após encerrar o ‘terceiro turno’ das eleições com a aprovação das alterações na Lei de Diretrizes Orçamentárias (LDO) de 2015, o presidente do Congresso convocou para a próxima terça-feira uma sessão destinada à votação do projeto que serve de base para a elaboração do Orçamento Geral da União. Apesar do curto prazo para a aprovação também do Orçamento, Renan Calheiros acredita em um entendimento para a votação ainda nesta semana. Dilma, que acompanha de perto os ritos parlamentares, aguarda a hora mais adequada para anunciar o novo ministério e, nesse momento, a performance do senador alagoano tem sido decisiva. Para agradar aos parceiros peemedebistas e ao aliado nordestino, Dilma tende a nomear um nome do Rio de Janeiro para uma vaga na próxima equipe de governo. Em visita ao Rio, nesta sexta-feira, Dilma agradeceu, pessoalmente, ao prefeito Eduardo Paes e ao governador Luiz Fernando Pezão por não terem aderido ao movimento de apoio a Aécio Neves, na campanha eleitoral. Paes e Pezão pediram, em troca, que um nome da política fluminense – e do PMDB – fosse indicado para o ministério. O nome em questão é justamente o de Pedro Paulo, também integrante do grupo peemedebista pró-Dilma nas últimas eleições.
No encontro desta tarde, a presidenta prometeu se empenhar para atender ao pedido do PMDB fluminense. A questão também faz parte da pauta da conversa que ocorrerá ainda esta semana com o vice-presidente Michel Temer. No entanto, uma solução é difícil, pois o partido pleiteia seis ministérios e nenhum lugar parece ao alcance de Pedro Paulo. Uma solução seria Dilma bancar o aliado de Paes e Pezão como sendo de sua “cota pessoal”. Outra possibilidade seria que o PMDB da Câmara, que já vai emplacar Henrique Eduardo Alves (RN) no ministério, bancasse Pedro Paulo, ex-secretário da Casa Civil da prefeitura do Rio e um dos oito deputados da bancada fluminense, a maior regional do partido em Brasília. Este arranjo, porém, encontra uma barreira no grupo liderado por Eduardo Cunha, que tenta se fortalecer para ganhar a Presidência da Câmara e controlar o PMDB no Rio de Janeiro.
Mais ministérios
Com Renan Calheiros posicionado como principal fiador da aprovação na mudança da meta fiscal, Dilma precisou receber, sem reclamar, a cobrança do PMDB do Senado na reforma ministerial para o próximo mandato. Em conversa privada no início da noite passada, Calheiros sugeriu que a bancada receba dois ministérios de peso político, mas preferiu não apresentar nomes. Embora a legenda saia enfraquecida com a rachadura causada pela candidatura de Cunha, Renan coloca como seu principal trunfo a fidelidade dos senadores do partido a Dilma durante o segundo mandato.
O nó nas negociações entre o senador e a presidenta, porém, tem sido as demandas do vice-presidente, Michel Temer, e da bancada na Câmara – o que tem levado o Palácio do Planalto a adiar, por mais de uma vez, o anúncio dos ministros da legenda. Havia a expectativa de que a presidenta divulgasse os ministros do PMDB nesta semana, após a vitória sobre a oposição, ao aprovar o projeto que alterou a LDO de 2014 e permitiu, na prática, o abandono do cumprimento da meta de superávit primário (economia que o governo faz para o pagamento dos juros da dívida pública). A conversa que Dilma teria, na véspera, com Temer sobre reforma ministerial não aconteceu e foi adiada sem sem previsão de nova data.
As pastas cobiçadas pelo PMDB do Senado são Minas e Energia, Cidades, Integração Nacional, Transportes e Turismo, sendo os principais candidatos Eduardo Braga (AM), para Minas e Energia, e Eunício Oliveira (CE), se Dilma decidir entregar a Integração à legenda. Após a aventura de Cunha, rumo à Presidência da Câmara, no entanto, o governo passou a buscar uma fórmula que atenda aos pedidos de cada um desses três grupos – Temer, Câmara e Senado. Na Câmara, porém, a complicação é maior devido à rebeldia da bancada, sob a liderança de Cunha, que imprimiu derrotas ao governo e promete novos episódios para os próximos meses.
O apoio de alguns parlamentares peemedebistas a Eduardo Cunha, porém, não passa da página dois. Vários parlamentares têm dito, em caráter reservado, que pretendem emplacar o atual presidente da Câmara, Henrique Eduardo Alves (PMDB-RN), derrotado na disputa ao governo do Rio Grande do Norte no Ministério da Previdência, e um segundo nome com mandato no ano que vem. Nesse caso, a maior aposta tem sido o deputado Pedro Paulo (RJ). Desta forma, a jogada mais delicada fica para o vice-presidente. Temer quer manter na Esplanada o atual secretário de Aviação Civil, Moreira Franco, e tornar ministro o deputado Eliseu Padilha (RS), que atuou na coordenação do PMDB na campanha de Dilma mas não disputou a reeleição. Cunha já avisou que não aceita Moreira Franco, seu principal desafeto, na cota da Câmara.
Comissão da Verdade
Para agradar ainda mais à presidenta, Calheiros tem prometido total apoio à tramitação das propostas da Comissão Nacional da Verdade (CNV) na Casa. A desmilitarização das policias estaduais é uma das oito recomendações de mudanças legais que fazem parte do relatório CNV, publicado no Diário Oficial do Poder Legislativo, nesta sexta-feira. Calheiros reuniu-se com o coordenador da CNV, Pedro Dallari, na véspera, e prometeu apoio à tramitação das propostas – algumas exigirão alterações da Constituição. Também constam do relatório propostas diretamente relacionadas à atuação policial, como tipificação do crime de ‘desaparecimento forçado’ e a criação de audiências de custódia, para a prevenção da prática de tortura e prisão ilegal.
Dilma relatou à CNV como a tortura era praticada por agentes públicos durante o período militar. As informações contidas nos depoimentos dão uma noção mais clara dos requintes de crueldade que não poupava nem mesmo mulheres e adolescentes, presos de forma clandestina e sem qualquer direito básico de defesa, algo injustificável mesmo por aqueles que pregam a volta dos militares como se vê em algumas manifestações ou se ouve de alguns parlamentares. Naquela época, a presidente Dilma Rousseff era uma das líderes de uma organização chamada Vanguarda Armada Revolucionária Palmares (VAR-Palmares). Ela foi presa em janeiro de 1970, pela Operação Bandeirante. Assim como outros opositores do regime militar, Dilma foi torturada e até hoje alega sofrer com sequelas físicas e psicológicas.
No relato que fez à Comissão Estadual de indenização às Vítimas de Tortura de Minas Gerais, em 2001, Dilma conta como teve um dente arrancado a socos, sobre as sessões de tortura (algo que parecia ser uma praxe entre os presos interrogados), sobre ser amarrada em um pau de arara e sobre os choques.
– Eu vou esquecer a mão em você. Você vai ficar deformada e ninguém vai te querer. Ninguém sabe que você está aqui. Você vai virar um ‘presunto’ e ninguém vai saber”, era uma das ameaças ouvidas de um agente público no período em que esteve presa. “Tinha muito esquema de tortura psicológica, ameaças (…) Você fica aqui pensando ‘daqui a pouco eu volto e vamos começar uma sessão de tortura’ – lembrou Dilma.
Dilma foi levada para a Operação Bandeirante no começo de 1970, em Minas Gerais.
“Era aquele negócio meio terreno baldio, não tinha nem muro direito. Eu entrei no pátio da Operação Bandeirante e começaram a gritar: ‘Mata!’, ‘Tira a roupa’, ‘Terrorista’,’Filha da puta’, ‘Deve ter matado gente’. E lembro também perfeitamente que me botaram numa cela. Muito estranho. Uma porção de mulheres. Tinha uma menina grávida que perguntou meu nome. Eu dei meu nome verdadeiro. Ela disse: ‘Xi, você está ferrada’. Foi o meu primeiro contato com o ‘esperar’. A pior coisa que tem na tortura é esperar, esperar para apanhar. Eu senti ali que a barra era pesada. E foi. Também estou lembrando muito bem do chão do banheiro, do azulejo branco. Porque vai formando crosta de sangue, sujeira, você fica com um cheiro”, relata.
A sangue frio
Oficialmente, a tortura sempre foi negada pelos militares. De acordo com o relatório da CNV, era uma prática instituída dentro do regime militar, inclusive com premiação de torturadores com a Medalha do Pacificador.
No caso de Dilma, o principal responsável pela tortura era o capitão Benoni de Arruda Albernaz. “Quem mandava era o Albernaz, quem interrogava era o Albernaz. O Albernaz batia e dava soco. Ele dava muito soco nas pessoas. Ele começava a te interrogar, se não gostasse das respostas, ele te dava soco. Depois da palmatória, eu fui pro pau de arara”, conta. Albernaz era o chefe da equipe A de interrogatório preliminar da Oban quando Dilma foi presa, em janeiro de 1970.
Um dos pontos mais gráficos nos trechos do depoimento de Dilma contidos no relatório fala sobre o episódio no qual teve um dente arrancado a socos, que lhe acarretou sequelas até os dias atuais. “Uma das coisas que me aconteceu naquela época é que meu dente começou a cair e só foi derrubado posteriormente pela Oban. Minha arcada girou para outro lado, me causando problemas até hoje, problemas no osso do suporte do dente. Me deram um soco e o dente deslocou-se e apodreceu. Tomava de vez em quando Novalgina em gotas para passar a dor. Só mais tarde, quando voltei para São Paulo, o Albernaz completou o serviço com um soco arrancando o dente”, conta Dilma.
Mas para estas pessoas, a principal memória dos dias em que foram submetidos a práticas desumanas e quase medievais de tortura, em pleno século 20, são as sequelas que perpetuam até hoje em suas vidas.
“Acho que nenhum de nós consegue explicar a sequela: a gente sempre vai ser diferente. No caso específico da época, acho que ajudou o fato de sermos mais novos, agora, ser mais novo tem uma desvantagem: o impacto é muito grande. Mesmo que a gente consiga suportar a vida melhor quando se é jovem, fisicamente, mas a médio prazo, o efeito na gente é maior por sermos mais jovens. Quando se tem 20 anos o efeito é mais profundo, no entanto, é mais fácil aguentar no imediato.
Fiquei presa três anos. O estresse é feroz, inimaginável. Descobri, pela primeira vez que estava sozinha. Encarei a morte e a solidão. Lembro-me do medo quando minha pele tremeu. Tem um lado que marca a gente o resto da vida.
Quando eu tinha hemorragia – na primeira vez foi na Oban – pegaram um cara que disseram ser do Corpo de Bombeiros. Foi uma hemorragia de útero. Me deram uma injeção e disseram para não me bater naquele dia. Em Minas Gerais, quando comecei a ter hemorragia, chamaram alguém que me deu comprimido e depois injeção. Mas me davam choque elétrico e depois paravam. Acho que tem registros disso até o final da minha prisão, pois fiz um tratamento no Hospital de Clínicas.
– As marcas da tortura sou eu. Fazem parte de mim – relatou Dilma.


 

Nenhum comentário: