Sacrificar os líderes históricos para “limpar a barra”?
A
presidenta Dilma se desculpou mas não foi ao importante encontro da
direção do PT em Brasília. O afastamento dos líderes José Dirceu, José
Genuíno e João Paulo Cunha da direção do PT pela corrente Construindo um
Brasil Novo é o prenúncio de uma
implosão do Partido dos Trabalhadores ?
Rui Falcão, ao sair do encontro em Brasília, falou que unidade não
significa unanimidade, e é de se esperar, porém, punir os fundadores
históricos do PT, pode ser interpretado como tentativa de agradar os que
colocaram o chamado “mensalão” nas recentes manifestações, aceitando
como final e verdadeira a sentença (ainda não passada em julgado e nem
concluída) do ministro Joaquim Barbosa do STF, que, pelo jeito, também
tem o rabo preso, com as denúncias de escapar ao fisco na compra de uma
casa em Miami.
A ausência da presidenta Dilma na reunião da direção do PT, em
Brasília, teria sido para evitar um encontro com os três líderes
históricos ali presentes e o risco de ser considerada como frequentadora
de más companhias pela grande imprensa ? Simples manobra política
consentida pelas duas partes para proteger sua imagem na próxima
campanha presidencial ou uma decisão unilateral de autoproteção, capaz
de criar ressentimentos e rachaduras?
Seja o que for, não é segredo que a maioria dos militantes do PT
esperava da presidenta uma modificação no setor das comunicações da
presidência e no Ministério das Comunicações, setores praticamente
ausentes durante as manifestações. Ao contrário, Helena Chagas, cujo
passado Globo não é perdoado, parece ter sido promovida a ajudante de
ordens da presidenta.
E o ministro, esposo da chefe da Casa Civil, faz de conta não saber
ou ouvir os reclamos de uma outra política que impeça o monopólio das
comunicações, do qual se beneficia o grupo Globo. Por que foi preciso um
blogueiro denunciar o processo de 2006 contra a Globo por fraude
fiscal, abafado numa gaveta e depois roubado dos autos por ordem de quem
? Por que esse processo não foi usado este ano como contra-argumento ao
mensalão ?
Ora, justamente a Globo e a grande mídia deram, em 2005, ao «
mensalão » o caráter de corrupção, desdenhando o seu lado de
financiamento de partido e criando no grande público a impressão de se
tratar de enriquecimento pessoal ilícito. O julgamento do « mensalão »
seguiu pelo mesmo caminho, de tal forma que os parlamentares
corruptíveis quase se tornaram vítimas inocentes.
Quem teria sido mais visado nas primeiras manifestações, o PT com seu
« mensalão » ou a presidenta Dilma, que, embora continue aplicando o
iniciado por Lula, é uma tecnocrata sem o carisma, a dinâmica e o jogo
de cintura do sindicalista ex-presidente ? Ou ambos ?
A impressão é a de que tanto o PT como a presidenta Dilma acabaram se
preocupando com as repercussões eleitorais das primeiras manifestações a
um ano da campanha pela reeleição. O PT querendo se desfazer dos seus
líderes históricos numa tentativa de « limpar a barra ». A presidente
evitando contato com os « condenados » para « não sujar a barra ».
Parece que o setor favorável ao licenciamento dos líderes históricos,
na verdade comprometidos por terem imaginado uma forma operacional do
PT, é majoritário, porém isso não silencia o descontentamento dos
solidários com Dirceu e Genoíno, os verdadeiros artífices do Partido.
Isso poderá levar a um racha, como já ocorreu no passado, mas sempre
envolvendo pessoas ou pequenos grupos, no caso de Erundina ou do PSol ?
Em que clima se poderá levar uma campanha presidencial marcada por
ressentimentos, injustiças e mesmo frieza entre o PT e a presidenta,
conhecida por sua maneira rígida de dirigir sem a flexibilidade de Lula ?
Para a direita, tudo isso é um inesperado prato cheio já feito.
Jogaram na convulsão social e na possibilidade de provocarem, como no
Paraguai e no caso Collor, um impeachment ou destituição da presidenta, e
estão colhendo uma divisão dentro do PT e entre o PT e a presidenta.
Será que Lula poderá colmatar as brechas surgidas ? Será que Lula tem
ainda saúde para isso ?
(Publicado originalmente no site Direto da Redação)
Rui Martins, jornalista, escritor, correspondente em Genebra.