sábado, 14 de março de 2015

Falta dialogar com a sociedade, diz ministro


Beto Barata - 13.mar.2015/Folhapress
Ricardo Berzoini, ministro das Comunicações, em Brasília
Ricardo Berzoini, ministro das Comunicações, em Brasília



Primeiro ministro de Dilma a fazer autocrítica no atual momento de crise, o titular das Comunicações, Ricardo Berzoini, afirma que o governo precisa se comunicar melhor com a sociedade tanto sobre o ajuste fiscal quanto sobre os desafios políticos.
"As pessoas gostam de ouvir a verdade", diz ele em entrevista à Folha.
Sobre a regulação da mídia, projeto dos sonhos de seu partido, o PT, o ministro afirmam que tem uma página em branco. E admite: se levar uma proposta do governo sem consenso com os demais setores envolvidos, o projeto sequer tramitará.
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Amanhã tem o protesto. Um mês atrás o governo achava que seria pequeno. Ricardo Berzoini - Não me surpreenderia se houver uma presença elevada de público. Especialmente porque temos um momento político com vários desafios colocados para o governo e para o Brasil. Nós precisamos estabelecer uma dinâmica de comunicação que permita as pessoas saberem desses desafios de maneira didática, tanto na questão econômica, que assumiu uma complexidade que não tinha há um ano, como na política, com a repercussão da Lava Jato, que coloca o tema negativo da corrupção. Nosso erro foi termos nos comunicado mal.
Está fazendo uma autocrítica?
Acho que o governo, no conjunto, e eu me incluo, não fez uma interlocução mais objetiva, o que prejudica a percepção das pessoas do que está em jogo. O Brasil enfrentou durante seis anos uma crise mundial de altíssimo impacto, e apesar disso conseguimos a menor taxa de desemprego da história em dezembro e elevação real de 70% do salário mínimo. Mas, ao mesmo tempo, esgotamos os espaços fiscais. Mas a crise foi muito além. Estamos entrando no sétimo ano de crise internacional. Não quero, no entanto, atribuir somente as nossas dificuldades à crise interna.

Na economia, que autocrítica faz?
Acho que na avaliação da duração da crise e na utilização dos mecanismos anticíclicos, talvez tenhamos ido um pouco além do que era possível, e talvez até aquém do que era necessário. Então agora é hora de reorganizar o orçamento sem prejudicar as políticas sociais fundamentais e sem comprometer os investimentos mais fundamentais. Não é um ajuste do tipo 'para tudo', mas essencial para chegar em 2016 com crescimento significativo.

Na campanha, vocês esconderam da população a real condição da economia?
Não, porque os números da economia são publicados todo mês. E algumas coisas se acirraram nos últimos meses do ano, como preço do petróleo e commodities. Mas nossos programas sociais foram mantidos. Não haverá qualquer tipo de aventura orçamentária. Assim como o fato de haver o ajuste não significa que o orçamento acabou.

O Datafolha trouxe em fevereiro a percepção de que Dilma mentiu na eleição. O que fazer para mudar essa imagem?
As pessoas fazem diferencia aquilo que é necessidade daquilo que é perversidade. Quando a situação é mais difícil, tem que buscar equilibrar as contas. É razoável que as pessoas se sintam preocupadas em relação ao futuro. As pessoas se perguntam sobre o emprego, a renda. A percepção da veracidade do que foi dito na campanha é algo que vai se construir a longo do mandato, não no curto prazo. Não podemos nos preocupar com pesquisas.

O sr. espera reatar com o eleitorado, é isso?
Claro, evidente. Em vários momentos da história do Brasil muitos governos enfrentaram impasses. E a gente supera isso aprovando as medidas do ajuste fiscal, dialogando de forma transparente com a população.

Esse diálogo transparente faltou na campanha. Na campanha vocês diziam que a oposição tiraria o feijão da mesa do trabalhador, faria tarifaço. Hoje, vocês estão aumentando os preços de luz, gasolina.
Não estamos fazendo ruptura com o discurso da campanha. Em crises anteriores, o ajuste era sobre os trabalhadores, a baixa renda e até sobre a classe média. Ficaram seis anos sem reajuste da tabela do Imposto de Renda. Hoje, discutimos se vai ser de 4,5% ou 6,5%. E não acredito em recessão este ano. Temos um momento que vai exigir de nós esforço para convencer as pessoas de que esse é o caminho. É esse o problema que nós tempos até agora, nós não conseguimos realizar uma comunicação eficiente em relação a isso.

De quem é a culpa por comunicar mal?
Nós todos temos responsabilidade de dialogar de maneira franca e transparente com o conjunto dos movimentos sociais, com empresários, com a imprensa, para deixar claro que o esforço que foi feito e que manteve desemprego baixo e renda alta não tem mais espaço para continuar. As pessoas gostam de ouvir a verdade. Como disse a presidente, a gente faz isso em casa e nas empresas.

Para vocês, diálogo franco é dizer das dificuldades atuais. Mas não diz que o ajuste só é desse tamanho por erros lá de trás.
Nós fizemos esforço para manter a atividade econômica. Evidentemente chegamos no limite, que não foi detectado em 2012, 2013. Foi detectado no fim de 2014. A contabilidade pública é transparente. Prestamos contas ao TCU. Não temos como esconder nossas contas de maneira sorrateira. Era necessário fazer para buscar o melhor.

Como a gente sai do buraco?
Com essa estabilidade fiscal, criando condições para que haja credibilidade efetiva de nossa política econômica dentro de um novo viés, que não é mais o anticíclico. Realizar investimentos. Não há nenhuma expectativa de que não haja investimentos. Eles vão ocorrer. O que estamos dimensionando é quanto temos de recursos dentro do que tempos. Não dá para imaginar que o país vai parar de investir este ano.

Manifestações vão crescer?
Isso é futurologia. O Brasil consolidou a cultura de participação pelas redes sociais, que acelera as mobilizações. Não há razão para tratar as manifestações como problema. Quanto mais a gente politizar e mostrar o que está em jogo e o que pode ser feito, é bom.

Mas essas manifestações não são a de junho de 2013. As atuais pedem o impeachment da presidente.
É um discurso golpista porque não haja os pressupostos fundamentais para isso, o que não fortalece a democracia. Não devemos aceitar violência nem a ruptura da ordem institucional. Quando há manifestação a favor ou contra, tempos de respeitar.

Mas com tão pouca popularidade ela não corre o risco de virar um Fernando Haddad?
Eu tenho avaliação que o governo Haddad é um bom governo e que vai buscar diálogo para se fortalecer. Temos que olhar para o longa-metragem que é o mandato, não para o retrato do momento.

A presidente está sitiada no Congresso, tem um processo no STF com políticos investigados. O clima é o pior possível. Como vocês saem disso com todos os astros conspirando contra?
Dialogando, dialogando, dialogando. Esta semana dialogamos e muitos vetos presidenciais que cairiam não caíram.

Quando vai encaminhar o projeto de regulação da mídia?
Abriremos debates públicos no fim do semestre. Vamos abrir diálogo muito amplo e sem prazo para encerrá-lo. Nesse tema, se não afastarmos os mitos e maniqueísmos não iremos a lugar nenhum especialmente numa conjuntura difícil como a que temos hoje. O governo não pode ficar nem surdo a quem diz que não tem que ter mudança nenhuma nem mundo com aqueles que dizem que tem que ter mudança profunda.

Qual a proposta do governo?
Não será o ministério que fará proposta isoladamente. Vamos buscar algum grau de entendimento. Eu diria que hoje ninguém tem hegemonia sobre esse assunto.

Dilma prometeu fazer regulação econômica da mídia.
A leitura que se faz é do monopólio e oligopólios. Vários países têm legislações sobre isso. Como não tenho uma proposta referencial, vou buscar que o debate comece com a cabeça aberta.

O PT é taxado de de querer controlar a mídia.
Injustamente. Não tem proposta de restrição de conteúdo.

Mas é contra a propriedade cruzada, por exemplo.
Não há razão para partirmos de uma opinião de um governo, que não é de um partido só.

Tem que entrar o papel do Google nesse debate?
Tem que discutir o papel da internet, de tudo, empresas de conteúdo. Aquelas que usam a rede e a que faz a infraestrutura da rede.

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