A Justiça de São Paulo, o Ministério Público (MP) e a Defensoria Pública apuram se agentes penitenciários do Grupo de Intervenção Rápida (GIR) atiraram balas de borracha, bombas de gás, usaram spray de pimenta, cães, agrediram com cassetetes e torturaram mais de 30 presos do Centro de Detenção Provisória (CDP) Vila Independência, na Zona Leste de São Paulo. Essas intervenções ocorreram nos dias 15 e 17 de fevereiro.
As agressões e torturas seriam a reação do GIR após alguns detentos discutirem e brigarem com dois funcionários do CDP nos dias 12 e 17 deste mês. Fotografias obtidas pelo G1 e divulgadas nesta reportagem mostram detentos de cuecas, feridos, com hematomas nas costas e nas pernas. Eles alegaram que foram obrigados a ficar nus.
Um funcionário chegou a ser hospitalizado por dois dias, e um preso continua internado – seu estado de saúde era desconhecido das autoridades até a publicação desta matéria. As brigas com os funcionários teriam ocorrido por causa de discussões sobre a quantidade de comida que deveria ser destinada aos detentos – a maioria deles é ligada a uma facção criminosa que age dentro e fora dos presídios paulistas.
O CDP Independência tem capacidade para 828 presos, mas está superlotado. Na quinta-feira (25), 2.387 detentos ocupavam a unidade.
O caso envolvendo as supostas agressões, torturas e punições aos detentos passou a ser apurado pela Corregedoria dos Presídios da capital do Tribunal de Justiça (TJ) e pela Promotoria de Justiça das Execuções Criminais do MP após denúncias feitas pelo Núcleo de Situação Carcerária da Defensoria Pública, familiares dos detentos, e órgãos de direitos humanos, como o Conselho Estadual de Defesa dos Direitos da Pessoa Humana (Condepe) e Conselho da Comunidade.
Documentos obtidos pelo G1 revelam que após os agentes apanharem de vários presos nos dias 12 e 17 de fevereiro, todos os detentos dos pavilhões quatro e oito, onde ocorreram as agressões, tiveram suspensos os direitos aos banhos de sol, visitas de advogados, parentes, entradas de "jumbos" (alimentos levados pelos familiares) e entregas de cartas e remédios controlados. Também relataram ter as roupas rasgadas e objetos pessoais levados, sendo obrigados a ficarem de nus ou de cuecas, "trancafiados" em celas superlotadas, sem colchões e energia elétrica.
Segundo os relatórios, como os agressores dos funcionários não foram identificados, todos os presos acabaram punidos. Ainda de acordo com os documentos, a direção do presídio e a Secretaria da Administração Penitenciária (SAP) tomaram conhecimento das sanções impostas aos detentos. A ordem teria partido de um coordenador da pasta e de um diretor do CDP.
Documentos obtidos pelo G1 revelam que após os agentes apanharem de vários presos nos dias 12 e 17 de fevereiro, todos os detentos dos pavilhões quatro e oito, onde ocorreram as agressões, tiveram suspensos os direitos aos banhos de sol, visitas de advogados, parentes, entradas de "jumbos" (alimentos levados pelos familiares) e entregas de cartas e remédios controlados. Também relataram ter as roupas rasgadas e objetos pessoais levados, sendo obrigados a ficarem de nus ou de cuecas, "trancafiados" em celas superlotadas, sem colchões e energia elétrica.
Segundo os relatórios, como os agressores dos funcionários não foram identificados, todos os presos acabaram punidos. Ainda de acordo com os documentos, a direção do presídio e a Secretaria da Administração Penitenciária (SAP) tomaram conhecimento das sanções impostas aos detentos. A ordem teria partido de um coordenador da pasta e de um diretor do CDP.
Punições e GIR
Pela Lei de Execução Penal, as punições coletivas são ilegais. Essas sanções são proibidas pelo artigo 45, parágrafo 3º da mesma lei porque violam a garantia constitucional da responsabilidade pessoal.
Procurada na tarde desta sexta-feira (26) para comentar o assunto, a assessoria de imprensa da SAP não respondeu aos questionamentos da equipe de reportagem até a publicação da matéria.
Procurada na tarde desta sexta-feira (26) para comentar o assunto, a assessoria de imprensa da SAP não respondeu aos questionamentos da equipe de reportagem até a publicação da matéria.
Na última terça-feira (23), o juiz-corregedor dos presídios da capital, Jayme Garcia dos Santos Júnior, visitou o CDP, na companhia de representantes da Defensoria e órgãos dos direitos humanos, e determinou a revogação de qualquer sanção coletiva aos presos. Desse modo, foram restabelecidos todos os benefícios aos detentos.
A Justiça também pediu à SAP os nomes dos agentes do GIR que atuaram na contenção dos presos nos dias 15 e 17 deste mês. Os responsáveis pela apuração querem saber se houve irregularidades ou excessos cometidos pelos profissionais. O Grupo de Intervenção Rápida funciona como uma espécie de tropa de segurança criada pela Secretaria da Administração Penitenciária para conter motins nos presídios do estado.
“Determinei procedimento para apurar possíveis irregularidades, sanção coletiva aplicada a pessoas presas por conta de duas agressões ocorridas com funcionários e possível abuso na atuação do GIR”, disse ao G1 o juiz Jayme, que atua no Departamento Estadual de Execuções Criminais (Deecrim).
Relatos dos presos
O juiz-corregedor e o conselheiro do Condepe, Luiz Carlos dos Santos, ouviram quatro presos. Os detentos contaram que os presos foram feridos por disparos de balas de borracha e pela detonação de bombas.
O relatório das declarações de um dos detentos informa que "o agente do GIR agrediu o declarante quando ele estava caído. Ele também cuspiu no declarante”.
“Aí, foi tiro, porrada e bomba”, relatou outro detento, este preso por assalto a banco e formação de quadrilha. Ele ainda disse que viu, "aproximadamente, 12 pessoas feridas pelos disparos e pela detonação das bombas".
“Nós ficamos trancafiados”, declarou um detento, que contou ter visto "mais de um preso ser agredido por agentes do GIR com tapas na cabeça e socos nas costas". Também disse ter ouvido "latidos de cachorros". Esse mesmo homem falou viu presos feridos por balas de borracha e presenciou a transferência de colegas para outros pavilhões. "Estava feio os ferimentos deles".
“Aí, foi tiro, porrada e bomba”, relatou outro detento, este preso por assalto a banco e formação de quadrilha. Ele ainda disse que viu, "aproximadamente, 12 pessoas feridas pelos disparos e pela detonação das bombas".
“Nós ficamos trancafiados”, declarou um detento, que contou ter visto "mais de um preso ser agredido por agentes do GIR com tapas na cabeça e socos nas costas". Também disse ter ouvido "latidos de cachorros". Esse mesmo homem falou viu presos feridos por balas de borracha e presenciou a transferência de colegas para outros pavilhões. "Estava feio os ferimentos deles".
Tortura
Relatório do Condepe apontou indícios de tortura praticados pelos agentes do GIR. "Eu estive com os presos, fotografei eles. Todos nos contaram que foram agredidos, baleados, humilhados e deixados nus. Se isso não foi tortura, o que é?", indagou Luiz Carlos à equipe de reportagem.
Para o defensor público Patrick Cacicedo, os agentes do GIR que entraram no CDP usando toucas ninja e sem qualquer identificação são suspeitos sim de cometer tortura.
“Acho que houve tortura", disse Cacicedo aoG1. "Submeteram pessoas sob ameaça de armas com intenção de aplicar castigo físico e mental”.
Segundo o Núcleo de Situação Carcerária da Defensoria, a punição coletiva é uma prática vedada por lei, mas é comum no estado de São Paulo. "Teve incursão violenta do GIR com diversos presos feridos. Terá de ser apurado de quem partiu a decisão de sanção coletiva, se da diretoria da unidade ou da SAP”.
Agentes
Procurado pela equipe de reportagem para comentar o assunto, Jacques Luiz de Sá, diretor regional do Sindicato dos Agentes de Segurança Penitenciária do Estado de São Paulo (Sindasp), afirmou que o GIR usou “força moderada” para conter os presos no CDP Vila Indepedência.
Segundo Jacques, a confusão começou quando o agente penitenciário responsável pela abertura e fechamento das celas do pavilhão 4, conhecido como zelador, foi agredido por mais detentos.
“Ele entrou para fazer o fechamento das celas e os presos disseram que não iam entrar. Então, ele disse que ia sair, quando levou uma rasteira e foi agredido por mais de 50 presos”, contou. "Logo após o tumulto, por medida de segurança, os demais pavilhões foram fechados e o GIR veio e trancou os presos que estavam amotinados”.
Ele disse que quando o GIR chegou no pavilhão, os presos haviam feito uma barricada. “Vários presos entraram correndo nas celas. O espaço da passagem é o espaço de uma porta. Imagine 30 [presos] tentando passar ao mesmo tempo, eles mesmos acabam se machucando”.
Barricada
Cada unidade do GIR entra em ação com 20 homens em média, segundo o diretor do sindicato dos agentes.
“Teve [detento] que fez barricada e foi pra cima do GIR quando a tropa entrou e acabou levando bala de borracha”, declarou. “Quando um pavilhão está amotinado, como o caso do pavilhão 4, não tem como fazer o procedimento de fechar o raio sem o uso da força moderada”.
Ele confirmou que foram usadas munições não-letais e bombas de gás lacrimogêneo para dispersar os detentos e socorrer o funcionário que era espancado. “Os presos estavam com canecas na mão cheias de Maria Louca. Eles estavam visivelmente alterados”, disse Sá Jacques. Maria Louca é nome da bebida alcoólica produzida pelos presos com restos de alimentos, como arroz, dentro das celas.
O diretor do sindicato não soube informar quantos presos acabaram se machucando oficialmente. “Quando o agente era agredido era tanta gente batendo, que uns [detentos] acabam agredindo os outros [presos]. Obviamente que um ou outro acaba se machucando no confronto com os agentes”.
As visitas de familiares aos detentos do CDP Independência devem ser reabertas neste fim de semana.
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